1.0
O ônibus da Ufac às 18h30 é lotado. Completamente lotado. Geralmente depois da metade do percurso ninguém mais consegue subir e ninguém desce. As pessoas lá só vão pra Ufac. Elas não vão descer na metade do caminho. Então o ônibus fica lotado. E ninguém mais entra.
Ainda assim o ônibus vai num silencio mórbido. Ninguém conversa, ninguém troca olhares. Eu olho todo mundo. Mas ninguém me vê, porque ninguém me olha, ninguém repara em mim, e ninguém repara em ninguém. Até o dia em que eu olhei praquela garota e surpresa, aquela garota olhava pra mim.
1.1
Eu estou deitado no colo daquela garota. Ela afaga meus cabelos e me canta musicas dos Los Hermanos. Ela adora as musicas dos Los Hermanos, ela ama, diz que o Marcelo Camelo é o poeta de toda uma geração. Eu odeio. Aliás, eu nem ligo. Eu gosto de escutar Arctic and Monkeys no meu ipod. Ela não tem ipod. Aquela garota de saias de renda canta Los Hermanos pra mim enquanto eu estou no colo dela. Eu odeio Los Hermanos. Mas eu gosto daquela garota. E a voz dela é tão gostosa.
Faz um calor danado na Ufac. É começo de maio. E debaixo de uma árvore eu estou no colo daquela garota. É sábado de manhã. Um ônibus passa por nós. Ele está vazio. Nenhum ônibus circula cheio na Ufac sábado de manhã. Só o primeiro. Aquela garota massageia meus cabelos. Ela olha pra mim e sorri. Ela canta baixinho “deixa eu brincar de ser feliz”. É uma frase bonita. Mas em seguida vem “todo carnaval tem seu fim” e eu sinto uma tristeza tão grande dentro de mim.
1.2
Aquela garota anda na minha frente. Nem de perto, nem de longe. Ela está numa distancia fixa. Vinte minutos atrás ela tinha dito “eu não sou capaz de te amar”. Quinze minutos atrás começou a chover desesperadamente. Dez minutos atrás ela começou a caminhar debaixo de chuva. Nove minutos atrás eu tentei abrir meu guarda chuva, mas ele quebrou, porque eu tentando limpar meus óculos sujos na frente de respingos d’água e atrás das minhas lágrimas acabei abrindo o guarda chuva errado. Oito minutos atrás eu estava começando a andar rápido para alcançar aquela garota, mas quando eu a alcanço, eu diminuo passo. Quatro minutos atrás eu estou completamente encharcado e minha cueca molhada incomoda porque começa entrar dentro da bunda. Dois minutos atrás aquela garota para de andar, eu paro junto, ela olha pra mim e diz:
“Eu estou indo embora e você nunca mais vai me ver”.
Um minuto atrás aquela garota foi embora. E eu nunca mais a vi. Zero minutos atrás, eu estou parado, chuva caindo, e a cueca não me incomoda mais. Meus óculos estão molhados por dentro e por fora.
11 comentários:
eita! diferente de tudo mesmo...
Porra Samuel
achei que tu seria superior a esse clichê.
Chuva?!
a narração parece a do Dr. Manhatan.
silencio no onibus da Ufac só for na ficção mesmo.
saia rodada o.O? Tenha dó.
e na minha opinião faltou um final trágico e sangrento.
Ficadica.
que bonito.
Sinto estranheza. Mas é pq eu te conheço.
Fora isso tá interessante.
;-)
Nem parece que você escreveu. Pelo conteúdo e pelo tamanho. HAHAHAHA
Já disse que amo os seus textos?
Se não, EU AMO!!!!!!!!
Tá bem diferente, mas variar é preciso, não é verdade!!
Seu melhor texto em muito tempo. Diferente, sim, mas muito bom. Não consigo gostar de meninas que cantam Los Hermanos, eu odeio Los Hermanos, me dão dor de cabeça. Saia de rendas são feias, ainda mais nos dias de hoje. Debaixo de uma árvore, chuva, ufac, parece um conto dos anos 70, mas ao som de Los Hermanos. Parece real e parece mentira. Mas eu gostei.
clap! clap! clap!
Achei lindoo... Tão palpável! Li e vi quase um filminho em sépia rolando no íntimo pensamento!
=D
Adoro o q vc escreve!
hummm...
sério, a parte da cueca foi desnecessária, rsrsrs
e eu tb odiava Los Hermanos. Hoje eu gosto.
Eheuheu.
Aposto que a sua cueca molhada dentro da bunda, odeia Los Hermanos. Rs.
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Conclusão importante acerca do que foi dito:
Cueca molhada. Bunda...
Depois disso, meu caro, vc esperava o quê? Era o mínimo que essa pobre criatura poderia fazer: ir embora e nunca mais voltar. Claro. Rs...
Abrass.
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