quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Os 10 melhores filmes de 2012 que você NÃO assistiu

Senhoras e senhores, é com imenso orgulho que eu aprensento a todos vocês queridos poucos leitores, mas seletos, a 5ª lista seguida dos dez melhores filmes de 2012 que você NÃO assistiu. Embora tenha esse nome, você possivelmente pode ter assistido algum desses filmes, é apenas uma brincadeira para divulgar filmes não comerciais de destaque internacional e obras que merecem ser vistas mas não tiveram lá tanto marketing.

E 2012 foi o ano da morte no meu gosto cinematográfico. Quase todos os filmes escolhidos para essa lista tem esse evento como um de seus principais momentos. A novidade é terem entrado países nunca antes imaginados na história dessa lista como África do Sul, Bélgica e Áustria. Uma nota necessária é que os dois filmes orientais presentes esse ano são relativamente mais antigos que o aceitável, mas não poderiam ficar de fora, seu sucesso no ocidente ainda é corrente.

A lista desse ano foi definitivamente mais fácil de fazer do que os anos anteriores. Ainda assim, vale ressaltar que ela é bastante pop, diferente de suas outras edições. Com a velocidade da internet, se os filmes são bons, eles simplesmente fazem sucesso não importa o país ou o quanto foram ocultos (beijo, Filmow). Simplesmente não ficam mais no anonimato. Ainda assim, divirtam-se, foi um prazer escrever!

Obs: nem todos os filmes citados foram produzidos e lançados em seus países de origem em 2012, mas a repercussão internacional e principalmente dentro do Brasil, foi esse ano.

10º Lugar: Bullhead (Rundskop – Bélgica)
 É impressionante como esse filme mesmo cheio de defeitos é capaz de nos cativar por um único motivo: seu fascinante personagem principal. Jackie Vanmarsenille sofreu um grande trauma na infância, numa cena que por si só já faz valer todo o filme. Por causa disso, ele tem de tomar injeções de testosterona que passam a fazer parte de sua rotina, o que o transformaram num homem forte como um touro, mas agressivo, exausto e impulsivo. Com uma trama não linear recheada de flashbacks, Bullhead sofre da falta de identidade, não se sabe se é um filme sobre uma história pessoal, ou um filme sobre a máfia dos anabolizantes para animais de corte de carne (há uma abordagem policial de fato que conduz o filme). Ficamos intrigados com Jackie, e o filme consegue sim passar a premissa de que “o homem é o meio que vive”. Jackie é diferente de todos os homens, isso o fere, o destrói por dentro, mas também destrói quem está no seu caminho mesmo quando ele tenta concertar sua vida, inclusive o telespectador.

9º Lugar: Um Verão Escaldante (Un Ete Brulant – França)
 Há poucos exemplos de nouvelle vague vivos hoje em dia. O cinema de Philippe Garrel é um desses poucos exemplos e um dos poucos bons. Em seu trabalho com Um Verão Escaldante, temos um filme que tem seu deslize como uma pintura que está sendo formada pincelada por pincelada. O filme é, claro, um contraponto ao cinema moderno, com plano sequências mais longos, foco nos diálogos e sentimentos, ações e reações, sem parecer um roteiro pré-definido, como se a história estivesse correndo em tempo real, como se víssemos algo que esta acontecendo agora, não algo que foi filmado. No filme temos o fim do relacionamento entre uma atriz (Angéle) e seu marido (Frédéric), um pintor que tem nela a inspiração para seu trabalho e vida, narrado sob o ponto de vista de um amigo do casal, com quem convivem durante uma temporada de verão na Itália. Parece bobo, mas não é. O foco da nouvelle vague sempre foram relacionamentos e a influencia dos meios nele. Embalados com a música e os cenários lindos, mesmo que fechados, temos uma pintura bidimensional que se move, junto com notável autorreflexão sobre a própria criação artística.

8º Lugar: Breathing (Atmen – Aústria)
 Roman Kogler tem 18 anos e está preso em um centro de detenção juvenil por ter matado um homem. O filme tem o grande feito de pegar um tema pesado e dar a ele uma delicadeza textual, que também é mérito da excelente interpretação de seu ator principal, o que eu duvido que ele teria conquistado sem aqueles lindos olhos azuis. Roman esta em liberdade incondicional tentando se ajustar conseguindo um emprego, mas a verdade é que Roman é inajustável, ele parece não ter vontade de viver, de mudar, de respirar. No necrotério de Viena, Roman começa a se organizar, ate se deparar com o cadáver de uma mulher morta que leva o nome de sua família. A descoberta leva o rapaz a se interrogar sobre seu passado pela primeira vez e a iniciar uma busca por sua mãe. Com belas cenas, Breathing é um mergulho a uma realidade fria de que nem todos nasceram pra ser especiais, únicos, essenciais ao mundo. Muita vida é banal. Mas até uma vida banal pode sofrer um baque tão grande, que esse rótulo pode ser perder ao menos para si mesmo e assim dar valor a própria respiração.

7º Lugar: Going Down in La La Land (mesmo título – EUA)
 Baseado no romance de Andy Zeffer, Going Down in LA-LA Land é um olhar sobre o lado mais gay de Hollywood. Embora muito romantizado e explicitando pouco a crueldade do meio, mergulhamos no mundo da pornografia, prostituição, drogas, mentiras e como as amizades certas podem nos sustentar e nos manter, tudo isso com um toque de humor divertido e um erotismo no nível certo. Adam chega a Los Angeles, terra das estrelas e sua pretensão é ser uma. Não consegue! Então, como um jovem belo e desejado, mas completamente sem dinheiro, começa a trilhar o caminho mais baixo daqueles que querem ser amados, adorados e idolatrados a qualquer custo. Em sua trajetória começa a fazer filmes pornôs e se prostituir. E é nesse ponto que o filme se sobressai, mostrando de uma forma não caricata esse mundo. É enquanto Adam percorre esse lado que o filme tem seus melhores momentos. Ele passa a desandar quando o rapaz se envolve no mundo das celebridades e Adam passa a ter um romance com um grande ator de novelas que vive no “armário”. As cenas finais parecem ate não condizer com o filme tendo em vista o romance que surge e toma tons clichês parecido com Uma Linda Mulher. Going Down é um conto que reflete a nossa cultura obcecada por celebridades e a era do entretenimento, onde todos os prazeres também possuem um preço, principalmente na terra de Hollywood.

6º Lugar: Three Extremes (三更2 – China, Coréia do Sul e Japão)
 É difícil fazer terror hoje em dia. Com a violência gratuita vendida pela TV e a falta de ideias originais para o gênero, tudo fica meio monótono, sem diferencial e pra piorar, não assusta. A obra trinacional Three Extremes é uma pequena pérola no meio desse mar de ostras vazias, com um terror mais psicológico e subliminar. Reunindo três diretores, o primeiro filme Dumplings (o melhor dos três), é o ‘terror da atitude’, conta como a obsessão de uma mulher com a estética contra o envelhecimento a faz ser influenciada pelos cuidados e elixires da juventude eterna fabricados por uma curandeira a base de fetos. O segundo filme Cult (do aclamado Park Chan-wook) é o ‘terror do desespero’, uma história de ciúmes e vingança que coloca um cineasta em um dilema que irá mudar sua vida depois que um louco sequestra ele e sua esposa e o obriga a jogar um jogo cruel, sádico com um final surpreendente. O terceiro (mais fraco, mas ainda bom) é Box, o ‘terror da culpa’, conta a história de uma jovem escritora, atormentada pela morte da irmã gêmea quando criança no circo em que viviam com o padastro. Os três são muito bons e saem um pouco do parâmetro de que terror oriental tem que ser feito na base dos espíritos malignos. Com temas polêmicos como pedofilia, aborto e canibalismo, Three Extremes mostra que o bom dos filmes de terror atuais é um ataque sutil sobre o nosso psicológico. Não causam realmente medo ou pânico, mas argumentam muitíssimo bem suas duas horas de duração.

5º Lugar: Beauty (Skoonheid – África do Sul)
Quando se termina Skoonheid, fica um gosto amargo na boca, um desprezo, uma vontade de vomitar de nojo. Nos anos que se discute tanto a aceitação gay em todo o mundo, esse filme leva a discussão pra outros aspectos, como a pressão de não poder se assumir gay nem para si mesmo e as consequências disso para a vida a longo prazo. Na obra, François, um homem casado, pai de 2 filhas, tem de lidar com a atração sentida por outros homens e o conflito que o sentimento desperta nele. É aquele tipo que fala mal dos gays, diz que odeia gays, faz questão de manter uma pose preconceituosa para se auto afirmar, mas na realidade vive uma perturbação mental. No casamento de sua filha, encontra-se com Christian, seu belo e jovem sobrinho que namora uma de suas filhas, e a atração que sente por ele logo torna-se obsessão doentia. François é frustrado sexualmente, educado no preconceito contra gays e negros, e o filme discute de modo geral como se desdobra este preconceito. Os temas são a repreensão sexual daqueles que não podem se assumir gays e a força da cultura africana branca do “varrer para de baixo do tapete”. Tem dois momentos “chocantes”, a “orgia gay da terceira idade” e um outro que não vale a pena dizer para não estragar. De fato, Skoonheid é indigesto, e por isso se torna um exemplo de porque o preconceito tem que realmente ser combatido.

4º Lugar: Memories of Matsuko (嫌われ松子の一生 – Japão)
E se o caminho da felicidade plena não envolver a felicidade? Como um dos filmes mais aclamados dos últimos tempos no Japão, Memories of Matsuko nos faz questionar isso, de que o sacrifício é o único caminho da plenitude. Baseado no romance de Muñeki Yamada, o longa foi considerado uma mistura de Amelie Poulain + Dançando no Escuro, o que é injusto, pois é muito superior aos dois. O ótimo diretor Tetsuya Nakashima nos conta a história fascinante de sua personagem título, Matsuko. Na verdade a história é contada por Shou, um jovem músico que vive uma decadência forte em Tóquio dominado pelo álcool e pornografia, até o dia que seu pai pediu para limpar o apartamento de sua tia, assassinada aos 53 anos. Começa então um mergulho por uma vida que parece ter sido só mais uma, quando na verdade é uma das mais surpreendentes que presenciamos, uma história tão profunda, que nos desperta as mais conflitantes situações. Drama, comédia , suspense, animação, musical e tantos outros gêneros são encontrados nessa obra épica. E aos poucos que a história se aprofunda, vamos mergulhando num mundo romântico e triste, difícil de resistir. Matsuko morreu e viveu no anonimato, como muitos outros, mas é justamente o legado de sua vida que fez a diferença, como tantos poucos.

3º Lugar: Shame (mesmo título – Reino Unido)
Quando Sissy canta New York, New York no restaurante onde se apresenta, seu irmão, Brandon, termina a apresentação com uma lágrima no rosto. Nós também. A incrível sequência de seis minutos é um dos momentos mais poéticos do filme. É como uma rosa no meio de um grande lixão, embora Shame tenha o feito de fazer com que todo o lixão também seja atraente da mesma forma como a rosa. Brandon sofre de erotomania, um distúrbio psicológico que gera compulsão pelo ato sexual. E o problema ocupa uma parte gigante de sua vida, buscando mulheres no metrô, tendo o computador cheio de pornografia no trabalho, masturbando-se em banheiros públicos, no chuveiro, contratando prostitutas, as vezes até transando com homens. Mas é um sexo vazio, sem sentimentos, com a visível necessidade de uma satisfação que não podemos presenciar, que apenas o personagem pode sentir, mas que notavelmente não lhe traz felicidade. Shame não vem discutir o distúrbio, vem discutir o personagem, que tem a vida abalada quando a irmã reaparece e vê seu problema piorar. O filme foi criticado por parecer que “pouco acontece” na tela. Injusto. Acontece muito. Mas é um filme sem respostas. Poucas respostas do presente, quase nenhuma resposta do passado (afinal, o que aconteceu entre os dois irmãos?) e sem respostas do futuro (talvez nada seja realmente resolvido). O maior feito de Shame então? Justamente desejar que queiramos essas respostas, mas não nos importarmos em ficar sem elas.

2º Lugar: Amor (Amour – França)
Existe uma máxima da auto ajuda de Facebook que diz “Hoje em dia as pessoas tratam relacionamentos assim: ao invés de tentar concertar, querem logo trocar por um novo”. Tem também aquela deliciosa música que sussurra “Fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz sozinho”. Amour me fez lembrar dessas duas frases durante o longo momento de reflexão que me fez ter. Georges e Anne são um casal de aposentados que costumava dar aulas de música. Mesmo com uma filha distante, os dois levam uma vida feliz a dois, se amando bastante mesmo após muito tempo juntos. Eles vivem um para o outro. Até que certo dia, Anne sofre um derrame e fica com um lado do corpo paralisado. Ambos passam então a ter que conviver com o começo do fim. Não sei se é exagero da minha parte, mas de todos os filmes que assisti, esse foi justamente o que me pareceu o mais irreal de todos. Talvez porque eu ainda seja jovem e amor sempre me pareceu uma coisa com data de validade. Mas esse filme não, ele retrata o amor como algo absurdamente profundo. Num nível que eu talvez demore uma vida para entender. O arrebatador filme nos faz mergulhar na dificuldade que é a solidão, no desespero da morte, no medo de perdermos as pilastras daquilo que sustenta nossas vidas. Se passando inteiramente dentro de um apartamento, tem uma estética bela como apenas o cinema francês é capaz de causar. Não é apenas uma histórica sobre um casal de velhinhos cujo esposo cuida da esposa adoecida (atuações assombrosas de tão boas). É mais um filme sobre ritos de passagem, só que o rito de passagem final. É o esforço do prolongamento da vida, a luta, a derrota e a aceitação. Falar mais estraga as surpresas e sensações. Mas é uma obra tocante, que nos faz frear um pouco a velocidade de pensamento quase da luz que temos hoje e raciocinar um pouco sobre o que queremos de verdade para nossas vidas.

1º Lugar: O Abrigo (The Divide – EUA)
Nunca tivemos um fascínio tão grande pelo fim do mundo como nos últimos anos. O apocalipse de várias formas tem moldado nossa imaginação. E os filmes do gênero se destacam imensamente, principalmente por suas produções, grandes cenários, histórias épicas e efeitos especiais. Não é o caso de O Abrigo e é esse seu diferencial, um viés diferente do apocalipse, que faz com que ele se sobressaia bastante aos tantos outros do estilo. Durante uma visível terceira guerra mundial, Nova York recebe um ataque nuclear. Num prédio residencial, sete pessoas e uma criança conseguem se refugiar no porão junto ao zelador, que já se preparava para o possível ataque, mas não para ter que se isolar com mais pessoas. Ficar nesse espaço é a única forma de se manter alheio as conseqüências dessa catástrofe, como a radiação, mas outro problema surge: como conviver em harmonia sem alimento, água ou qualquer tipo de estrutura num grupo de pessoas tão diferentes e algumas perigosas? É aí que o filme se torna incrível, explorando o limite racional dos seres humanos. Todos os atores estão absurdamente bem na tela com atuações que enchem os olhos e o roteiro tem tantas viradas que suas quase duas horas passam muito rápido. A medida que as coisas vão piorando tudo passa a desandar rápido, ainda mais depois de uma visita rápida dos “inimigos”. No terço final, tudo já esta tão desesperador e imprevisível que começamos a entregar nas mãos de Deus e nos preocupar unicamente com o destino da “mocinha”. O final? As atitudes no desfecho e seu encerramento são surpreendentes num nível alto e que joga um choque de realidade: Se o mundo um dia acabar ou por guerra, ataque zumbi, profecia religiosa, qualquer motivo, não haverá nada de fascinante nisso.