quarta-feira, 25 de junho de 2008

Aprenda A Se Tornar Um (Pseudo) Cult

A minha vida de trabalho (escravo), aliada a estudante universitário, dono-de-quarto (sim, eu sou mesquinho) e modelo anoréxico (ok, só anoréxico), está causando uma mudança tão drástica na minha vida que só divergindo sobre o assunto pra vocês entenderem.

A questão é o seguinte. Estava eu indo para meu emprego A, no hospital, num típico dia nublado quando meu avô liga o rádio e como fundo musical toca Calypso. Depois que a música em foco passa de sua primeira repetição de refrão (porque esse tipo de música sempre repete o refrão pelo menos quatro vezes pra criar volume e chegar a 3min30s de duração), eu percebo que existe algo errado, algo que não faz parte do equilíbrio cósmico que mantém o universo funcionando, algo que vai além da compreensão da natureza, que talvez não seja explicada nem pelo divino... Meus lábios estavam se movendo, sorrateiramente um som saia da minha boca. Eu estava cantando junto com a Joelma.

Eu dei um grito. Meu avô quase perdeu o controle do carro. E enquanto eu gritava "Tirem ela de mim. Tirem ela de mim. Xoelma, NÃO!", apertando todos os botões possíveis do rádio para mudar de estação, matá-lo, ou simplesmente desligá-lo, minha mãe desesperadamente gritava no banco de trás, "O que foiiii?". Eu sabia a letra, eu sabia o ritmo, a sincronia, os gemidos que ela dava. Enfim, eu estava possuído.

Foi com esse caso que ao me olhar no espelho eu não vi mais aquele garoto que escutava The Beatles, tinha idolatria por Bob Dylan, era fã incontornável de Mika e Dangerous Muse. Muito menos o garoto que assistiu quase todas as obras de Almodóvar, nunca perdia um Cannes, descobria sozinho no mundo underground todos os mais fascinantes filmes alternativos. E onde estava aquele que entendia de moda, comportamento, tendências editorias, virtuais e jornalísticas? Na frente do espelho eu vi um garoto castigado pelo trabalho árduo, consumista, que escuta apenas a rádio popular, que cantarola Calypso no trabalho A, Victor e Léo no trabalho B (gente, eu to quase aceitando a idéia de ir pro show), que vibrou assistindo O Homem de Ferro no cinema, que está querendo ver o novo Hulk e que anda perdido em tendências e só soube que o São Paulo Fashion Week estava rolando quando ele chegou na metade (via Te Dou Um Dado?).

Se ver no espelho e ter uma crise por se achar um tribufú já não é fácil. Ter uma crise por se ver no espelho e se achar coloquial é pior ainda.

E foi assim que eu descobri que ser uma pessoa ligada a cultura e as tendências do mundo pop e underground (outra palavra que eu adoro usar) não é nada fácil.

Aliás, foi observando uma discussão entre uns grupos culturais aqui da cidade e a minha própria vida (mais pra antes do que pra depois) que eu resolvi presentear os leitores desse blog com o Manual de Como Ser Culto. Com pequenos passos que podem ser seguidos facilmente até pelos amantes da Mulher Melancia, o Fala Consciência vai ensinar para você, leitor esperto, a como carregar o título de cult, alternativo, underground, pitoresco, indie, ou seja, um (pseudo) culto.

Passo 1 – Tenha grana e tempo sobrando
Lógico que você NUNCA vai admitir isso, afinal, você não vai ter a grana na verdade, pois você vai ser sustentado pelos pais ou por aquela vó aposentada pelo TSE que ganha uma nota e só tem o querido netinho pra corujar. Enfim, a grana não é sua, mas você gasta. E gaste bem, com livros, filmes, ingressos para o teatro, bandas de garagem. Carro? So se for usado e surrado. Ou como você vai poder levantar a bandeira do preço alto para os eventos culturais em frente ao teatro municipal se você tem um Corolla esperando na saída? Com a grana, você não precisa se prender a coisas nada culturais como trabalho com carteira assinada, faça no máximo uma faculdade voltada para artes, comunicação ou sociologia (Filosofia, Música, Artes Cênicas, Letras, Jornalismo, Publicidade e Propaganda dão status, mas Ciências Sociais é a top). E com o tempo livre sempre se dedique a programas alternativos, bares undergrounds, cinema de artes, sebos (livraria é coisa de rico) e por aí vai.

Passo 2 – Seja sempre a frente do seu tempo
Arthur Rimbaud é um dos poetas franceses que mais marcaram o mundo (mais pela sua vida gay es-cân-da-lo-sa, do que pelo seu trabalho, enfim...). Sua obra é considerado sempre “a frente do seu tempo” (ou seja, ele morreu pobre pra ser reconhecido depois). Logo, se você deseja ser conhecido como alguém culto, você tem que ser moderninho e transgressor total. Defenda sempre idéias com um fevor absurdo, suba em cima da mesa, tenha o dom da oralidade, saiba chamar a atenção de todos para o seu redor. Torne-se um incompreendido (mas no campo das idéias sociais, não vem com nada emocional não ou tu vai ser considerado emo e não culto).

Passo 3 – Tenha estilo
Você acompanha o Fashion Rio? Então você não é culto. Você acompanha o São Paulo Fashion Week? Então você é culto só se for pra estudar tendências de comportamento e diversidade capitalista . A sua pose tem que ser inabalada. Você não pode ser escandaloso (ou vai ser bixa louca), mas você tem que saber chamar a atenção, principalmente quando você esta explicando porque aquele filme é uma droga e você prefere o livro (que você não leu). Fume muito Marlboro, Golden Gate, Gudang Garam, mas Free, Carlton e Master não pode. Só beba destiladas, Absolut comanda (mas compre-a em grupo, NUNCA só você, é coisa de burguês), vinho também, principalmente em sarais. Tenha sempre aquele ar de esnobe, aquela pose blasé, cuidado com a gesticulação, desmunhecar pode, falar arrastado pode, usar gírias em inglês pode, em português NUNCA. Sempre critique quase tudo, principalmente em espetáculos, mas quando demonstrar que gostou de algo, bata palmas sempre de um jeito que o difira do resto da multidão, quase psicodélico, de preferência com o cigarro na boca, gritinhos e assobios, sempre mantendo a pose de esnobe.

Passo 4 – Saiba vender a sua imagem
Saiu com os amigos para um café sem açúcar? Então ocupe uma cadeira só com sua bolsa de tiracolo (NUNCA use mochila, mochila é coisa de universitário que tem estágio), e sua bolsa tem que ser grande, mas nunca o suficiente para você, e cheia de buttons personalizados. Sempre deixe a sua edição da Bravo!, Caros Amigos e Carta Capital a mostra. NUNCA use roupas de marca. Sempre prefira blusas listradas (preto/vermelho ou preto/branco) jeans surrados ou bermudas, além do óculos de armação grossa preta ou branca e o All Star que pode ser qualquer modelo contanto que seja All Star, pulserinhas artesanais também dão um toque. Cabelo grande bagunçado (tipo Arctic and Monkeys) para meninos e cabelo preto escuro curto ou ondulado (tipo Karine Alexandrino) para meninas. Sempre domine as conversas, principalmente depois de filmes alternativos ou peças patrocinadas pela Lei de Incentivo a Cultura, mostrando seu conhecimento de caso.

Passo 5 – Morte ao POP
Você não assiste rede Globo porque ela “manipula, distorce os fatos, aliena e lança musicas como Créu em nível nacional”. Séries de sucesso como Heroes e 24 Horas devem ser evitadas ao extremo, de Lost você deve gostar apenas da primeira temporada. Você não escuta rádio, só podcast’s especializados. Cinemark NUNCA. Porque só passa blockbusters comerciais Hollywoodianos. Nada de livros do Harry Potter, tire a fantasia da sua vida, exceto O Senhor dos Anéis e a primeira trilogia (feita) de Star Wars, mas nada de fanatismo e cosplays. Sempre tenha jazz no seu MP3, mas ele não pode ser da Apple. E sempre esteja ligado a iniciativa científica (essa bem menos), aos coletivos culturais, selos independentes, cenário underground e o mesmo do gênero. NUNCA concorde com o que todos concordam. Gente culta tem sempre opinião própria (é do contra).

Esse é um Passo a Passo de ficção, mas qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência.

Quanto ao meu período pouco cultural, eu vou retomar aos poucos minhas atividades, tentar concilia-las, mesmo porque eu to gratificado com os podcast’s do André Fischer (eu achei tudo quando ele falou, “vocês sabem como é difícil ser underground em Los Angeles”, super que eu sei). Tenho que passar longe de coisas como Amigo Fura Olho do Latino e minhas conversas animadas sobre o Palmeiras no corredor da UFAC.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Como Lidar Com Decepções e Frustrações (Na Verdade Eu Não Ensino Isso Não, Mas Lê!)

Aí Samuel não tinha o que fazer da vida e resolveu encarar um segundo emprego. E tipo, eu to trabalhando 10 horas por dia, mais 5 de faculdade, 1 hora pra almoço, outra pra janta... bem, vocês devem imaginar que minha vida pessoal e sexual tá bombando, né?

Quando o fim de semana chega, eu levanto as mãos pro céu e quase choro de emoção. E para aqueles que acham que chocolate é melhor que sexo, estão muito enganados, o sexo é a melhor coisa já inventada, só que em segundo lugar vem o consumismo. Então, depois de muito suor, esforço e gente querendo me agredir a ponto de eu só não apanhar de um paciente no hospital porque o guarda não deixou, eu finalmente comprei meu notebook. Ai Keth que também comprou seu carro novo manda uma mensagem pra mim: “Amor, estamos tão ‘bem nascidos na city’, motorizados, conectados e antenados”, sendo que eu respondo, “E endividados até o pescoço”.

Pra enfiar o pé na lama de vez, eu resolvo que to sem roupas e saio às compras com o Frederico numa angustiante tarde de frio. Fazer compras é sempre uma sensação maravilhosa, da uma revitalização na alma, na cara, você se sente ate mais bonito. E mesmo os pequenos detalhes não incomodam, como quando a companhia que você chamou pras compras te faz o maior climão e com um único movimento rápido e ágil melhor que o do Naruto, derruba metade do andar superior da loja no exato momento em que você decidiu que não quer ficar mais lá. Por um flash de momento eu voltei à realidade. Mas passou rapidinho quando eu entrei na loja seguinte. Sempre passa. Fiz a linha Kátia Cega total.

O maior problema de fazer compras (e é uma coisa meio exclusiva com roupas) é que depois de 24 horas parece que o efeito da morfina passou e você olha pras sacolas ainda não esvaziadas e pensa consigo mesmo “Que porra foi que eu fiz?”. Resultado, do que adianta você ter dois empregos se a sua patroa vira na realidade a empresa do seu cartão de crédito? Vou trabalhar só pra pagar ela. Oh, Discórdia!

Eu to com duas dessa... uma em cada pé!

Sentimentos de felicidade e plenitude seguidos de tristeza e depressão alternando muito rapidamente (o que pode ser caracterizado facilmente como decepção e frustração) não é uma coisa exclusiva de fazer compras. Lembro que quando chegou aos meus ouvidos a notícia de que Speed Racer viraria um Live Action pelas mãos dos mesmos diretores de Matrix, eu fui no céu e voltei. Depois de Matrix e a magnífica produção de V de Vingança, acreditei que aquele que é um dos maiores clássicos da animação mundial ganharia uma repaginada tão marcante que se tornaria o maior blockbuster do ano. Esperei por cinco meses, contei as horas na semana final, faltei aula na UFAC pra assistir a estréia na data mundial, sentei na cadeira com o coração na mão, quando as luzes se apagaram eu apertei com força o braço da poltrona e... cinco minutos de película depois eu já estou no chão chorando, gritando por dentro “Esse filme tem que melhorar, tem que melhorar, uma hora ou outra, tem que melhorar”.

Saí tão decepcionado da estréia de Speed Racer, mas tão decepcionado, que se alguém tivesse me visto na hora que eu saí do cinema alguém teria me perguntando, “Samuel, você acabou algum namoro?”. Speed Racer é infantil, subestima a inteligência do espectador, é cheio de clichês, a construção dos personagens não convence, a direção de arte não deveria ter forçado tanto e a construção e desenvolvimento do roteiro é de uma superficialidade boba, que não desafia, que não cria um carisma real por aquilo que se vê. Quase igual ao... próprio desenho!

A cena inicial é de uma grande corrida de Speed entrecruzada com flashbacks relacionados ao seu irmão, Rex, com uma sobreposição da corrida feita pelo irmão junto a do próprio Speed. Um saco! Existe apenas uma ótima compensação às cenas desnecessárias de Gorducho, o fraco relacionamento de Speed e sua namorada, os nada tensos momentos familiares, as bobas cenas de ação, e a destruição do incrível personagem do Corredor X (alguém pode me explicar o que diabos é aquele momento do encontro dele com Speed na pista vazia?), e essa compensação é a velocidade. As corridas de Speed Racer são apenas, em duas palavras, do caralho. Um show de cores e efeitos especiais que deslumbra os olhos de qualquer amante da computação gráfica aliada ao cinema. Mas afinal, Speed Racer não é isso? Velocidade e cores? Então ele ate cumpre bem seu papel. É decepcionante. Mas é mágico.

"Speed Racer, Speed Racer, Speed Racer Goooo..." Go bueiro abaixo

Ah, já que eu comecei a falar de blockbusters (a única coisa que eu ando assistindo e que me ajuda a não criar “crise cinéfila por Cannes”), vale ressaltar que O Homem de Ferro superou as expectativas de qualquer um, e mesmo não sendo um filme histórico, é divertidíssimo, cumpre seu papel de entretenimento (de fazer dinheiro) e te faz sair do cinema se imaginando naquela armadura vermelha cintilante e com um cinturão de utilidades mil vezes melhor que o do Batman. Aliás, sou só eu ou vocês também tão empolgadíssimos em ver o Coringa (que Deus o tenha) e o Duas Caras em O Cavaleiro das Trevas? Sim, eu gosto de vilões, porque vilão é personagem de personalidade.

Indiana Jones E O Reino da Caveira de Cristal é outro que fechou super bem a primeira leva de blockbuster’s do ano. O começo é empolgante, vibrante e principalmente, foda, como todo bom Indiana deve ser. Mesmo com um Harrison Ford ofegante, vale lembrar que ele com 65 anos é capaz de fazer mil vezes mais coisas que eu com 20 (dizem que pilates ajuda, você consegue colocar a ponta do pé na cabeça facinho, na hora do sexo deve ser uma loucura). Tá certo que depois o filme perde um pouco de fôlego, e a entrada do viadinho de Transformers (ah, eu não vou com a cara dele e pronto, agora eu faço bico) só piora a situação. Ainda assim, temos Cate Blanchet que sozinha é capaz de levar metade do filme, foda como só ela é capaz, e o deslumbramento de pequenos detalhes, como a Arca tão desejada no primeiro filme e que se tornou nada mais que apenas um segredo no magnífico, sombrio e abandonado Galpão dos Segredos. Assim como o próprio Indi, com seus inúmeros e fantásticos feitos, passará um dia a ser apenas uma lembrança, num lugar cheio delas.

Piores que decepções e frustrações com o cinema, só as decepções e frustrações com o próprio ser humano. Esse é que nem um Windows Vista, te leva do riso aos prontos em questão de segundos, a diferença é que quando um ser vivo da merda, você não pode enviar uma mensagem de volta pra Microsoft dizendo que a bagaceira não ta rodando bem.

PS: como vocês devem ter percebido, o Fala Consciência! ganhou uma aparência nova, designer arrojado (adoro usar essa expressão, tem poucas oportunidades pra encaixá-la), tudinho presente de aniversário do Frederico (não, não perguntem como foi meu aniversário). Muito obrigado Frederico. Mas e ai, o que acharam? Fofo, lindo, bacana, legal, gay demais? Fique na linha, a sua opinião é muito importante para nós.