2013 foi um ano bom para o cinema não blockbuster que tomou um fôlego novo, principalmente com o boca a boca das redes sociais. A novidade é terem entrado países nunca antes mencionados aqui como Chile, Holanda e Dinamarca. Filmes orientais também estão presentes, aliás, o cinema oriental só tem surpreendido.
Uma lista que esse ano foi fácil e gostosa de fazer, cheia de retoques. Com recursos como Filmow e IMDB, filme bom hoje em dia não fica mais no anonimato. Divirtam-se, foi um prazer escrever cada linha!
Obs: nem todos os filmes citados foram produzidos e lançados em seus países de origem em 2012, mas a repercussão internacional e principalmente dentro do Brasil foi esse ano.
10° lugar: Queda
Livre (Freier Fall – Alemanha)
Não é exatamente um filme bom. Seu roteiro inconstante não
faz com que seja dos mais carismáticos e nem sempre a química do casal
convence. Ainda assim, esse romance gay alemão tem algo de tocante. Quando o
recém graduado policial Marc acha que sua vida está perfeita, feliz no trabalho,
casado e esperando o primeiro filho, as coisas tomam um novo rumo quando se
aprofunda num relacionamento com seu colega de academia, Kay. Não é preciso muito
pra adivinhar o quanto o romance dos dois será auto destrutivo. Não basta a
cabeça de Marc virar de pernas pro ar, Kay está bem convencido do que quer e que vai
lutar pelo que ama. É um filme questionador do ponto de vista de
relacionamentos, sua complexidade, aquilo que achamos certo e aquilo que
realmente queremos. No fim, Marc criou uma prisão para si mesmo e a única coisa
que poderia lhe dar a liberdade é justamente aquilo que ele mais passou a ter
medo.
9° lugar: Boven is
het stil (mesmo título - Holanda)
É um filme contemplador, o que no mundo cinematográfico quer
dizer: não acontece muita coisa. E não acontece mesmo, ainda assim nos faz se
questionar bastante. Como o filme tem seu significado apresentado pelo todo, não vale
falar muito, mas essa produção holandesa nos faz mergulhar na vida de Helmer,
que vive uma vida desagradável numa fazenda. Seu pai está doente e não sai da
cama, sendo Helmer responsável por dar banho, comida, limpar suas imundícies e
o manter na cama, com um detalhe: eles se odeiam. Helmer é grosseiro, reservado
e não consegue dialogar com ninguém. Ele traz no rosto a própria imagem de
amargura, reclusão e de um sofrimento que parece que não vai acabar nunca. O
filme retrata esse aspecto e possibilidade de Helmer mudar, mas para isso irá
precisar de muito mais que querer, ele precisará se livrar de pesos que talvez
nem ele reconheça quais são.
8° lugar: Doomsday
Book (인류멸망보고서 –
Coréia do Sul)
A coletânea coreana de três filmes retrata de diferentes
formas o que seria o fim do mundo. Mas não se engane, embora os diretores Kim
Jee-woon e Yim Pil-Sung tenham feito obras interessantes, apenas uma realmente
vale a pena, o segundo episódio: Heavenly Creature. A mais profunda das três
partes, o média metragem é uma mistura da filosofia budista com um futuro
distorcido onde uma grande corporação robótica se torna tão poderosa quanto o
governo e influencia na vida e nos costumes de toda a população. Esteticamente,
mesmo com pouquíssimos cenários, o filme é belo e a fotografia funcional. Na
trama, o robô In-Myung deixa de ser um ajudante do templo e passa a ser um
monge. Fascinados com o nível de consciência adquirido pelo robô, os outros
monges o consideram o próprio Buda. Quando a corporação robótica descobre, um
problema surge. A cada cena em que o robô In-Myung aparece, existem elementos
da caminhada em busca da iluminação espiritual. Da flor de lótus, a diagramas,
textos e o Buda Iluminado, vários símbolos são usados como contraponto em meio
aos cenários. O questionamento é um só: a iluminação de deus só existe para os
seres humanos ou isso é capaz de ir muito além?
7° lugar: Segredos de
Sangue (Stoker – Estados Unidos)
Quando Park Chan-wook foi convidado a realizar seu primeiro
filme hollywoodiano, o mundo tremeu. E não tremeu tão desmerecidamente assim.
Stoker é intrigante, charmoso, chega a ser fascinante. Mas a sensação de que
falta algo permeia o filme o tempo todo. Para Park, sexo e sangue estão
relacionados a ritos de passagem. E Mia é uma jovem que após a estranha morte
do pai e o aparecimento de um tio até então desconhecido, irá passar por todo
um ciclo de mudanças junto ao homem tão misterioso. O filme
transita por gêneros, do terror ao suspense e o erotismo. A presença de Nicole
Kidman como a mãe de mente perdida de Mia também ajuda muito. É belo e nos
prende do começo ao fim, mas quando os mistérios são resolvidos, a impressão
que dá é que mesmo esteticamente irrefutável, seria uma trama melhor se passada
na Coréia do Sul mesmo.
6° lugar: Adeus,
minha rainha (Les adieux à la Reine – França)
Superprodução francesa de época, Adeus, Minha Rainha é mais
um filme a tentar nos levar a mente daquela que foi a mais intrigante
personagem monárquica que o mundo ocidental produziu: Maria Antonieta.
Diferente dos outros, temos aqui uma rainha mais real, apresentada pelo ponto
de vista de sua criada, Sidonie. Começando exatamente um dia antes da queda da
Bastilha, o filme mostra de forma magistral o desespero e os acontecimentos que
tomaram conta da corte francesa no período seguinte. Sidonie é apaixonada por Maria
Antonieta, a idolatra, a ponto de não ver a real face da doentia e descontrolada
rainha. É apenas quando o romance da rainha com a duquesa Gabrielle de Polignac fica evidente, que Sidonie passa a fazer parte de um jogo cruel, que mostra de forma sutil como a falta
de moral levou toda a corte francesa a uma derrocada que eles mesmos nunca
foram capazes de prever. Filme de valor histórico sensacional.
5° lugar: Um Estranho
no Lago (L'inconnu du lac – França)
Aclamado na França, chegando a ser considerado o filme do
ano, Um Estranho no Lago é intrigante, mas primeiramente merece uma atenção: se
mesmo não tendo nada contra a homossexualidade você não se sente a vontade
vendo sexo gay, não o assista. O sexo entre homens é o elemento norteador desse
thriller a moda antiga com tons hiticockianos. Na trama somos apresentados a Franck,
um rapaz que assim como diversos outros homens se dirige a um belo lago no
verão não apenas para se banhar, mas para conseguir sexo fácil, a famosa
“pegação”. Ao se interessar perdidamente por um outro homem, passa a observá-lo
ate presenciar um assassinato. Mas o que deveria ser um rumo natural para a situação
toma outra forma quando Franck começa a se relacionar com o assassino. Filme a moda
antiga, mistura o voyeur e o suspense. Há uma tensão considerável em sua maior
parte, mas o final pode ser bastante frustrante. Uma experiência
cinematográfica realmente diferente, como só os franceses são capazes de
proporcionar.
4° lugar: A Caça (Jagten
- Dinamarca)
Existe uma máxima de que crianças não
mentem. Mentira! Crianças mentem sim. Seja por medo, por culpa, até mesmo por
maldade, ou por mera inocência. O sensacional A Caça fala disso, como uma
mentira inocente contada por uma criança é capaz de afundar completamente a
vida de um ser humano. Na trama, um respeitadíssimo professor de jardim
da infância de uma pequena comunidade tem sua vida virada do avesso quando Klara,
uma menina de 8 anos, filha de seu melhor amigo, confunde seus sentimentos pelo
professor e resolve repetir à diretora da escolinha uma frase que ouviu dos
irmãos - algo que coloca a cidade inteira contra o professor, que é acusado gravemente
de ter abusado sexualmente da menininha. É um filme angustiante. Com fotografia,
roteiro e atuações surpreendentes, acompanhamos esse caso perturbador, quando
mesmo sabendo da inocência do acusado, vemos seu mundo desmoronar, seu filho se
perturbar, seus amigos odiá-lo e apenas uma certeza: mesmo que ele se livre da
acuação, as marcas ficarão para sempre. É um filme crescente. Seus momentos
finais (a cena na igreja, a caça em si) são de ficar sem ar. Porque o mundo se tornou imune ao impacto visual da
violência por causa da mídia, mas a pedofilia não, nossas crianças são sagradas
e o crime será sempre um dos mais condenáveis, mesmo que elas mintam.
3° lugar: Traga-me a
cabeça da mulher metralhadora (Tráiganme la cabeza de la mujer metralleta – Chile)
Sou um apaixonado pelo estilo grindhouse. Quem me conhece
sabe disso. E como o estilo não é mais produzido, sobram as homenagens. Pra
piorar, a grande promessa do ano, Machete Kills, foi um grande fiasco. Mas é do
Chile que vem um dos filmes mais divertidos de 2013, esse sim uma verdadeira
homenagem ao grindhouse. O filme conta a história de DJ, o azarado músico que
estava no lugar errado, na hora errada, quando se vê obrigado a caçar a Mulher
Metralhadora, maior assassina de aluguel do país, que prometeu matar o maior
gangster do país, que por ventura é o chefe do DJ e ex marido da própria Mulher Metralhadora. Engraçado como poucos que eu
vi esse ano, o filme é tosco, bizarro, cheio de personagens caricatos, roteiro
pífio e atuações exageradas. Ou seja, só amor. Há uma série de referências
também e a mais marcante é ao jogo GTA, com o filme roubando caracteres e o
sistema de missões.
2° lugar: Evangelion 3.3 – You can (not) redo (ヱヴァンゲリヲン新劇場版:Q – Japão)
É difícil demais falar desse filme sem ter que se relatar a
seu legado homérico de mais de 20 anos de criação e que existe até hoje.
Terceiro filme do remake (?) da série original, essa obra prima japonesa teve
um ano de atraso em seu lançamento, mas só de lembrar, perco o ar. Depois do
mega impactante 2.0, 3.0 nos traz um mundo completamente diferente de tudo o
que imaginávamos, 14 anos após os acontecimentos do último filme, num planeta
quase morto devido a um Impacto pela metade. Todos estão diferentes, menos
Shinji, que precisou desse tempo todo para ter seu corpo reconstituído. Não
importa a dezena de novos personagens, é um filme precisamente focado em
Shinji, pois o mundo mudou, ele não. E esse conflito de mudanças tão drásticas destrói
Shinji por dentro de maneira crescente, até ele encontrar conforto e esperança
no único que lhe estendeu a mão, Kaworu, aquele que todos nós sabemos ser na
verdade Tabris, o anjo do livre arbítrio. E não importa as intenções
divergentes de todos ali, 3.0 é um jogo, o mais cruel de todos, planejado e arquitetado
por alguém que deseja tanto uma ressureição, que é capaz de matar o planeta
inteiro por isso, inclusive seu próprio filho. Um filme perturbador para quem
entende do universo de Evangelion, que nos faz descobrir que nem a redenção é o
suficiente para a salvação.
1° lugar: Antes da
Meia Noite (Before Midnight – Estados Unidos)
Há cerca de 20 anos, jovens românticos de todo o mundo foram
maravilhados pelo romance Antes do Amanhecer. A trajetória do casal que se
conhece em um trem durante uma eurotrip e em 24 horas vive uma belíssima
história de amor inspirou centenas de jovens a procurarem o mesmo nas estações
de trens europeus. Alguns anos depois o casal se reencontra no divergente Antes
do Por do Sol, num belo reencontro lírico de pessoas que se amaram como nunca
antes por apenas um dia e passaram anos sem se ver e saber nada um do outro.
Antes da Meia Noite é a conclusão da trilogia desse casal, que agora
encontramos casados e com gêmeas de sete anos. Passando férias na Grécia junto
a um grupo de amigos entre escritores e poetas, o filme é um marco assim como
Antes do Por do Sol, por manter a mágica de sua origem, mesmo que cada um traga
momentos tao distintos da vida. Jesse e Celine não são mais jovens apaixonados, são
adultos vivendo num mundo adulto, onde o peso das responsabilidades da vida
tomam proporções completamente diferentes. Falar muito estraga. O grande trunfo
são seus diálogos profundos em planos sequências sensacionais nas regiões
banhadas pelo Mediterrâneo. Não importa a idade ou a fase que nos encontramos,
Antes da Meia Noite nos mostra que alguns sentimentos simplesmente são os
mesmos indiferentes a metamorfose do amor. Se mudam, talvez nunca tenham sido reais.