quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Os 10 melhores filmes de 2010 que você NÃO assistiu

Pelo segundo ano consecutivo (embora possua três edições), o Fala Consciência encerra sua temporada com a tradicional lista dos 10 melhores filmes do ano que você na verdade NÃO assistiu. O post nada mais é do que uma brincadeira e ao mesmo tempo uma forma de mostrar filmes que não tiveram muito sucesso ou destaque no ano, mas que na verdade não deveriam deixar de ser assistidos.

Em 2010, o cinema continuou fraco de idéias em suas veias mais alternativas. De fato, alguns dos filmes mais interessantes do ano como A Origem, Scott Pilgrim e A Rede Social são superproduções, derrotando os diretores e roteiristas mais alternativos que costumam lançar obras mais complexas e reflexivas. Talvez por isso a lista desse ano tenha sido tão difícil de fazer.

Não obstante, vocês provavelmente podem ter assistido até três dos filmes indicados, o que é uma vergonha pra mim que costumo produzir a lista com filmes que eu acho que ninguém mais por aqui assistiu. A maior surpresa fica por conta de pela primeira vez termos um filme nacional, um argentino e um japonês, além de três produções de orçamento considerável, duas delas tendo atores famosos, o que até descaracteriza a ideia original, mas como eu disse, foi difícil. Ainda assim, divirtam-se, comentem e me digam quais vocês já assistiram.

Até 2011.

Obs: nem todos os filmes citados foram produzidos e lançados em seus países de origem em 2010, mas a repercussão internacional e principalmente dentro do Brasil, foi esse ano.

10º Lugar: Mister Nobody (Mr. Nobody – Alemanha, Bélgica, Canadá, França)
Existem filmes que tem tudo para ser um desastre. É o caso de Mr. Nobody, que possui Jared Leto como um de seus protagonistas, simplesmente um dos piores atores/cantores do mundo ocidental. O impressionante, é que o filme sobrevive a isso. Mais do que sobrevive, assistir Mr. Nobody te dá uma sensação parecida com a do filme, a de que o tempo não faz mais sentido e a relatividade se torna não uma questão da física, mas pessoal. Arrepiante é a premissa dessa obra: e se você pudesse reviver em várias vidas todas as grandes escolhas que o destino te obriga fazer? E se ao invés de escolher um caminho, você pudesse viver todos eles? Num futuro onde a imortalidade chegou para todos, menos Mr. Nobody, que espera o fim tentando lembrar quem ele realmente foi, o prazer da vida está justamente no fato de podermos fechar nosso ciclo de existência, pois Mr. Nobody prova que só através da morte alcançamos a verdadeira imortalidade.

9º Lugar: Pandorum (Pandorum – EUA, Alemanha)
Todo, eu disse TODO, filme de ficção científica tem um único objetivo na cabeça de seu diretor: ser o novo 2001 - Uma Odisséia no Espaço. E lógico, nenhum até hoje conseguiu nem chegar perto disso. Para a sorte de Pandorum, mesmo tentando ser 2001, ele consegue apenas ser parecido com outro bom filme de ficção científica: Alien - O 8° Passageiro. O filme começa muito bem. Na história, dois membros da tripulação de uma gigantesca espaçonave despertam sem lembranças de como chegaram ali, quem são ou quanto tempo dormiram em câmaras de hibernação. A medida que eles descobrem se tratar de uma nave de colonização, já que a Terra foi extinta, a coisa se torna complicada com a existência de uma raça alienígena que se alimenta dos humanos em hibernação. Os defeitos de Pandorum estão em seu recheio, mesmo com as ótimas atuações dos dois protagonistas a trama se perde um pouco. Mas o visual claustrofóbico e o terror de imaginar a situação, além de seu ótimo final, o colocam num bom patamar do gênero.

8º Lugar: Pecado da Carne (Einaym Pkuhot – Israel)
Pecado da Carne só pode ser considerado a versão judaica do ótimo Brockeback Mountain. E sem ser tão bom, o que já compromete o filme. Mas então por que o destaque? Simples, ele viaja por uma Israel que nem seu cinema, tão engajado em mostrar uma sociedade israelense moderninha, paz e amor, gosta de revelar. Esse é o motivo por exemplo de eu não gostar de A Bolha (que junto com Delicada Atração e Antarctica coloca Israel num interessante patamar de filmes gays mesmo num país ultra conservador). Sua história gira em torno de Aaron Fleishman (Zohar Shtrauss), cujo pai morreu recentemente, deixando-lhe como herança um açougue. Casado, pai de quatro filhos, Aaron resolve abrigar, num quartinho do açougue, um jovem estudante chamado Ezri (Ran Danker). O jovem é famoso no bairro por ser bem rodadinho, e nasce um sentimento bem quente entre os dois. De fato, a péssima tradução do título faz juz ao filme em si, a relação dos dois homens é mais carnal do que sentimental, deixando claro que nem mesmo os dogmas da sociedade mais arcaica de Israel é capaz de lutar contra a natureza do homem. Uma verdeira viagem por um lado complicado de uma sociedade tão castigada pelas grandes mudanças do mundo.

7º Lugar: O Signo da Cidade (Brasil)
Se tem um filme que até hoje eu não aceito que tenha levado o Oscar de Melhor Filme, esse é Crash. Ele que já era um filho bastardo de Magnólia acabou gerando uma outra dezena de bastardinhos e o nacional O Signo da Cidade é um deles. Mas ta aí, gostei desse filme. O drama mostra a cidade de São Paulo, que na verdade acaba sendo sua personagem principal e completa a minha teoria de que a cidade em si é como uma grande (não levem a mal) prostituta. Atraente, perigosa e fascinante. Com fotografia quase totalmente noturna, não embeleza Sampa, mas revela um fascínio. E no meio disso uma leva de personagens perdidos tentando se encontrar num universo tão grande onde reina a impessoalidade. Os diálogos são bons, os personagens são interessantes (menos o casal suicida, completamente irritante), mas é o fato de que suas histórias realmente podem estar acontecendo agora nessa cidade, uma das maiores do planeta, que mais nos atrai.

6º Lugar: A Centopéia Humana (The Human Centipede: First Sequence – Holanda e Reino Unido)
Depois de assistir A Centopéia Humana, eu passei algumas noites demorando pra conseguir dormir, não porque estava aterrorizado com o filme, mas porque seu exercício cinematográfico é simplesmente... sublime! Odiado por onde passou, esse filme que adquiriu status de cult underground é o resultado de uma ideia doentia sendo levada muito a sério. A principio, todos imaginavam a mesma coisa do filme, toneladas de nojeira, sangue e escatologia. Foque absoluto no sadismo e um roteiro fraquíssimo. E não é bem isso! Na trama, um cientista louco cujo sonho (ou pesadelo?) é criar uma nova forma de vida ligando três pessoas para gerar uma única criatura, usa duas turistas americanas e um japonês com problemas mentais. E... ele consegue. O interessante é que ACH é em sua primeira metade um verdadeiro clichê de filmes de terror, captura, perseguição, foco no vilão e a obviedade de que as vítimas não irão escapar. Depois o filme se torna o que é exatamente por sua ideia original vendida no título. Junte isso ao fato do filme não ser gore e temos uma produção enxuta, angustiante, que vai mexer com todas as suas emoções explicitando um horror inimaginável. Temos aqui também um dos maiores vilões da história do cinema de horror e um final impressionante que, isso sim, vai te tirar algumas noites de sono.

5º Lugar: O Segredo dos Seus Olhos (El Secreto de Sus Ojos - Argentina e Espanha)
Existe uma lógica que não aceito questionamentos em O Segredo dos Seus Olhos: o roteiro parece ter sido escrito pelo John Grisham. Na trama, o aposentado Benjamín Espósito escolhe para tema de seu livro o caso criminal que mais marcou a sua carreira no Tribunal Penal de Buenos Aires, um estupro seguido de morte de uma jovem recém casada. Para ordenar as ideias, ele revê o homicídio que investigou em 1974 e termina repensando as decisões feitas no passado. Na primeira metade do filme somos engolidos por uma direção de arte e fotografia tão lindas que encantam os nossos olhos. Mas é a partir de um momento marcante, a fantástica tomada do estádio de futebol, que o filme toma um rumo que enche de orgulho saber que cinema arte de tamanha qualidade com toques contemporâneos foi feito na América do Sul. A trama policial passa a tomar um rumo de humanização lindo, tocante e por diversas vezes triste. Mas é em seu momento final (com uma revelação surpreendente) que assim como Espósito nos questionamos se ainda dá tempo de revertermos algumas das escolhas de nossas vidas, pois como diria um dos personagens da trama, "o homem pode mudar tudo, menos a sua paixão".

4º Lugar: Eu Matei Minha Mãe (J'ai tué ma mère – Canadá)
Deve haver algo entre os diretores canadenses (deve ser a água que eles bebem) que faz com que sejam os melhores do mundo ao retratar o olhar cinematográfico sobre as instituições familiares. Não demais, alguns filmes como C.R.A.Z.Y. e O Primeiro Dia do Resto de Sua Vida são alguns dos melhores que assisti na vida. E embora Eu Matei Minha Mãe não entre para esse seleto time, ele entra fácil para lista dos melhores filmes a retratar justamente a família, esse elemento tão difícil de trabalhar em película. A obra traz o retrato de um dos maiores problemas da adolescência e que tantas vezes sai do controle, as dificuldades de se relacionar com os pais. Hubert (Xavier Dolan, que aos 17 anos escreveu, dirigiu e atuou esse filme) e sua mãe Chantale (Anne Dorval) vivem juntos de forma muito conturbada. Não há vilões aqui, há amor, mas ódio na mesma intensidade. Eu Matei Minha Mãe não é um retrato de um único lado. Hubert não discute com a mãe porque ela é a grande vilã e Chantale está ali tão perdida quanto o filho que criou sozinha. É um filme sobre incompreenção, mas retrata melhor ainda como compreendemos mal até aqueles que amamos. Além de chegarmos à conclusão de que mesmo quando queremos superar as distâncias, talvez o ideal seja aumentá-las.

3º Lugar: Sede de Sangue (Ba
kjwi – Coréia do Sul)
I Am Cyborg, But That’s Ok pareceia ter levado Park Chan-wook a um caminho sem volta: o da rendição de seu estilo de produzir filmes aos mesmos moldes americanos. Felizmente, Sede de Sangue é seu pedido de desculpas para o mundo e um ‘chupa’ para a América. Essa obra sensacional não tem também um estilo, vai do drama ao humor negro em segundos, do macabro ao emocional, do gore ao clean. Nele, o padre Sang-hyeon (Song Kang-ho) é muito devoto de sua fé, mas também acredita na ciência e se submete a um experimento do qual poucos saem vivos. Ele reage mal, e quase morre, mas uma transfusão de sangue o traz de volta a vida. As pessoas começam a achar que ele é santo, mas Sang-hyeon na verdade se tornou um vampiro. É muito bacana ver os dilemas de Sang tentando resistir ao ímpeto de beber sangue humano, de respeitar a vida que ele tanto acredita ser sagrada. Já não bastasse isso, a política do diretor retoma a ideia de que todo homem está condenado a ruir na mão de uma mulher, até mesmo os vampiros. E é num relacionamento doentio entre o padre e a mulher cínica e dissimulada que ele passa a amar que temos aqui uma trama de fetichismo, uma verdadeira história vampírica oriental que deixaria Bram Stoker orgulhoso.

2º Lugar: O Mundo Imaginário de Dr. Parnassus (The Imaginarium of Doctor Parnassus – França e Canadá)
O gênero cinematográfico da fantasia só existe por um único motivo: encantar. Não é o caso, por exemplo, do desastroso Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton, que pecou por achar que infantilidade, mais efeitos especiais e amadorismo salvariam seu filme. O Mundo Imaginário de Dr. Parnassus não só nos leva a uma viagem linda pelo mundo da fantasia, como nos convida a ir junto e prova que a fantasia quando se é adulto é ainda mais fascinante que quando criança. A questão é (e isso também é a premissa do filme): você é capaz de se entregar justamente aquilo que lhe faz bem? Nick (Tom Waits, o diabo) faz um pacto com Parnassus (Christopher Plummer): em troca da imortalidade, Parnassus promete ao Diabo a sua filha quando ela completar seus 16 anos. Mas Parnassus não acreditava que um dia teria um filho até que conhece e se apaixona por uma mulher, a mãe de Valentina (Lily Cole). Desesperado, Parnassus tenta uma última cartada para manter seu amor: conseguir cinco almas para ele antes do aniversário de Valentina, em três dias. Junte isso a aparição do misterioso Tony (Heath Ledger, Johnny Depp, Jude Law e Colin Farrel), que embora ajude Parnassus, devemos sempre lembrar que foi colocado em seu caminho pelo próprio diabo e temos uma trama de reviravoltas elegantes. É no tal mundo imaginário que está a grande sacada do filme: quando você deixou de sonhar? Salvar a própria alma não é uma questão de se entregar ao pecado, mas deixar de viver se entregando as regras de uma sociedade que não deseja seu bem pessoal. Para tudo existem consequências, O Mundo Imaginário mostra que os covardes morrem idosos, mas os corajosos... bem, esses tem uma vida de incertezas, mas ainda assim, estão vivendo de verdade.

1º Lugar: Evangelion 2.0 – You Can (Not) Advance (ヱヴァンゲリヲン新劇場版:破 – Japão)
É revoltante eu colocar esse filme como o melhor filme (não) assistido de 2010. Pelo simples fato de que para realmente entender as 2h dessa fantástica produção japonesa é necessário um investimento gigantesco para aí sim chegar a Evangelion 2.0. Existe algo que sempre comprometeu Evangelion: a pressa. O autor tem grandes dificuldades em escrever a obra em mangá (um volume a cada dois anos estava sendo a média). Por causa disso, mas apostando em sua imensa qualidade, foi criada a série em anime, que adiantando parte da série em mangá, se tornou um marco sem precedentes da animação japonesa... se não fossem seus desastrosos dois últimos episódios. Resultado: alguns anos depois resolvem refazer o final, em filme. Sensacional, do caralho, de infartar qualquer fã... mas só a primeira metade. Mais alguns anos e resolvem agora refazer TUDO, do zero, em quatro filmes. E os fãs pensam: que saco! Felizmente, nós fomos presenteados. You Can (Not) Advance é então o segundo filme desse remake, um filme que leva essa cultuada série no mundo inteiro a algo completamente novo, misturando os elementos antigos da trama com novidades e uma nova complexidade sem limites. Apenas quem é fã de verdade vai entender. Quem não é fã e se arriscar a assistir vai apenas se sentir embelezado com a obra, seus efeitos (é uma animação), as batalhas dos mecas e os anjos e... boiar no resto. Para os fãs, é um resgate de uma história inesquecível sobre o fim dos tempos, mas maltratada, que pela primeira vez está tendo o tratamento que merece. Mais que isso, a recriação das identidades dos personagens Shinji, Asuka e Rei são envolventes, a nova personagem, que revela a preferência pelo lado desumano dos Evangelions (robôs construídos para lutar com os anjos encarregados pelo extermínio da vida na Terra) é a visível criação de uma anti heroína fascinante. E Kaworu... bem, Kaworu é um dos seres mais aclamados da série, sua cena sentado sobre seu próprio Evangelion na Lua é fascinante. Mas é em seu final após os créditos que Evangelion mostra para que realmente existe: para mostrar que somos seres não evoluídos, fracos, frágeis de coração e mente, menos de alma, essa sim, que pode se conectar a outros seres vivos e nos defender do fim de nossas próprias existencias, com seu brilho, também conhecido como Campo A.T.