segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A maioria dos músicos não são iguais a vinho

Geralmente as melhores festas na minha vida são automaticamente classificadas como as piores também. Explico: é que sempre que eu vou numa festa boa e eu estou me divertindo acontece alguma merda. Foi assim na minha formatura do terceiro ano por exemplo. O Flávio ficou tão bêbado, mas tão bêbado, que ele não se aguentava em pé, vomitava nos sapatos Arezzo das meninas e gritava: “Todo mundo nu!”. Não deu outra, sobrou pra mim cuidar dele no auge da festa, da diversão e tudo mais. Nunca vou esquecer desse dia. Eu acordei na manhã seguinte com o Flávio na minha escrivaninha lendo meus textos e dizendo: “O que aconteceu ontem mesmo?”.

Sim, ele não tinha ressaca. Não, ele não se lembrava de nada. Sim, eu quis matá-lo. Não, ele não sabe quanto dinheiro tinha a menos na carteira dele e quanto tinha a mais na minha.

Anos se passaram desde esse incidente e algo parecido se repetiu esse ano. Eu estava no iate clube de Florianópolis tentando me consolar pela perda do show de David Guetta (fã é uma coisa, doido que paga R$200 por um show é outra). E lá estava rolando o show da dupla espanhola Chus & Ceballos na lendária festa E-Joy. Primeiro que o iate clube de floripa é um lugar realmente incrível para uma festa, segundo que a E-Joy é realmente lendária. A vontade que eu tive no dia seguinte era de pregar um adesivo no carro: “Eu fui na E-Joy e sobrevivi”. Festa fantástica, muita gente, turistas de todas as regiões e nativos curtindo o som. E eu lá chegando no auge... tenho que sair porque as companhias queriam. Pra piorar, o taxista que pegamos era um tiozinho tarado que estava vendo o DVD da Gretchen e tipo... não era um show.

A apresentação de Chus & Ceballos foi muito boa. O público reagiu bem, eles tentavam se superar e se situar. Não foram de muito sucesso em alguns momentos, mas eles pegaram realmente o espírito da coisa. O som dos espanhóis é uma coisa bem mista, eles tem um lado latino óbvio misturado a uma coisa mais tech house, ora mais tribal, ora mais progressivo, um som bem diferente daquilo que a maioria está acostumado mas que é capaz de fazer o sangue ferver. Não decepcionou, mas também não surpreendeu.

O cenário musical eletrônico anda assim. Mantém um ritmo, mas não é inovador. Grandes DJ’s não estão mais se destacando no meio. O que surge são pequenas obras primas, em cada lado do globo, e que se difundem não pelas festas ou pelos shows, mas pela internet e pelo boca a boca. Um ótimo exemplo disso foi o que aconteceu com o bizarro e divertido som francês do Yelle, que no ano passado alcançou o topo nas baladas mais descoladas, mas eu lembro de uma entrevista da vocalista dizendo que não tinha dinheiro ainda pra se mudar definitivamente pra Paris, morando no interior. Eu também poderia trabalhar com os exemplos de Hercules and Love affair ou do ótimo som indie/eletrônico do Matt and Kim que se apresentaram recentemente no Brasil, mas eu quero falar do grande, porém pequeno, cenário da musica eletrônica brasileira.

É isso ai meus amigos. Eu fico com uma felicidade quase idiota quando digo isso: o Brasil está apresentando uma ótima cena eletrônica. Dá até vontade de dizer que esse país agora anda pra frente e finalmente se tornou o país do futuro tão falado desde 1950. Mas ai é demais, né minha gente? O principal responsável por esse feito é o paranense Péricles Martins, percussor do Boss in Drama.

Falar do Boss in Drama é difícil. Mas ouvir é de um prazer indiscutível. A primeira música do MySpace do rapaz já é contagiante por si só. Favorite Song não lembra nada do que é produzido no Brasil, nada mesmo, aliás, eu não tenho referência nem nos EUA, o mais próximo que eu posso dizer que se compara é o inglês Erol Alkan. Mas é um som muito animado. A palavra para definir Boss in Drama é: atrevimento. Pode parecer bobagem, mas na musica eletrônica isso significa muito.

O som é energético, extrapola os limites e as fronteiras de estilo e vai se tornando uma mistureba generalizada de elementos. Nós temos uma completa overdose entre o pop, o eletro, o rock, dance, house, hip hop, funk (Jesus, tem um funk chamado Contaminada dele que é horrível, mas eu relevei). A ousadia está aí. Não ser fiel a porra nenhuma, somente a diversão. É misturar hits autorais com os de outros músicos, é fazer a musica durar apenas dois goles, não alongar, não prolongar, mas nunca parar.

Nessa onda Boss in Drama também se encontra o bacana duo brazuca Database, pequeno sucesso nas pistas do sul e sudeste do Brasil, que dificilmente você vai ouvir um dia na Globo, mas que encontra largamente em blogs, revistas de públicos restritos, MySpace's da vida. O duo tem um som muito pop também, mas menos rítmico e barulhento que o Boss, e ainda assim mainstream ao limite. Guarde esse nome, os meninos do Boss in Drama e do Database ainda vão fazer um barulho legal nos seus ouvidos.

Mudando de pau pra cacete. Eu posso dizer que uma das melhores coisas musicais que eu conheci esse ano foi o The Last Shadow Puppets. Ok, o álbum The Age Of The Understatement foi lançado no ano passado, mas eu só ouvi falar dele esse ano. Shadow Puppets não é uma banda, é um projeto paralelo na vida de Alex Turner (vocalista do Arctic Monkeys) e Miles Kane (atual Rascals). Aliás, fica muito difícil considerar as doze faixas do álbum como um trabalho paralelo, é menosprezá-los, é diminuir uma realização sonora fantástica, incrível, vívida e que representa tudo aquilo que uma geração de jovens quer ouvir de verdade, um revival de tudo que tivemos de melhor no passado, com o toque do que temos de bom hoje e com a juventude gritante de Alex e Miles.

Você escuta The Last Shadow Puppets e acha que mergulhou de volta nos anos 60, mesmo com as letras um tanto melancólicas e trabalhando o cotidiano. Deus, a canção Standing Next to Me parece que foi composta pelos Beatles, é a melhor do álbum, junto com a ótima faixa título The Age Of The Understatement e My Mistakes Were Made For You, num casamento de vozes tão perfeito que assusta. Um ponto interessante é que esse é um trabalho que Alex Turner só poderia ter desenvolvido após o sucesso com o Arctic Monkeys, a banda que deu o sangue que a mídia inglesa tanto deseja, mas que hoje se encontra tão “diferente” de como começou.

Ao ouvir Humbug, novo álbum do A&M, me perguntei onde estava aquele som muleke que tanto me atraiu no primeiro. Definitivamente algo não estava certo. É bom? É! No geral Humbug é bom sim, mas eu me senti até assustado, era algo que eu não estava esperando vindo de Alex e sua turminha. Talvez isso represente um novo ciclo pro Arctic Monkeys, uma renovação do seu sangue, não sei, ainda não consigo deduzir. Mas eles estão tentando inovar, isso é fato, não é quem nem a maioria dos músicos que tem medo disso e mantem apenas a fórmula do habitual. Todo esforço de mudança deve no fim ser reconhecido e válido, independente da música eletrônica ou do indie.