quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O amor é cego, surdo, mudo, aleijado, tetraplégico e respira por aparelhos...

Eu achava que a melhor cena de romance que eu tinha assistindo em 2008 havia sido essa:


Até assistir essa:


É interessante a necessidade que nós seres humanos temos de expressar o amor de alguma forma. Alguns foram além e utilizaram-se da sua forma de expressão para colocar isso na arte, na literatura, na música, no cinema, TV. E o mundo ocidental foi condicionado a uma única forma de amor. Aquele que deve nos fazer feliz. De fato, só existe essa maneira de expressar o amor, a de transformá-lo em nossa felicidade plena.


Aí me vem Machado de Assis, com seu Bentinho e sua Capitu. Bentinho, um pamonha e viado enrustido, nutria seu mais absoluto desejo por Capitu. Mais que isso, por ela, Bentinho foi capaz de largar tudo, e deixar tudo em segundo plano. E o que o amor fez por ele? O envelheceu, o degenerou, o destruiu completamente, o enlouqueceu. O amor não fez muito bem para Bentinho. Ele o transformou num homem casmurro. Ele, justamente ele, que tanto se dedicou ao amor.


Machado de Assis veio para mostrar ao Brasil que o amor não é a melhor das coisas não, como dizia José de Alencar e qualquer outro que aqui escrevesse. Já Monique Garde, veio para mim com uma cena já clássica em Ó Pai, Ó, em que um travesti desce a rua, ao som de “Tô Carente”, do Calypso e se entrega a um desejo louco por um taxista preto, safado e casado. É, Monique querida, você veio com uma simples cena nos ensinar como o amor é complicado.


E se tudo vai mau na vida das pessoas, elas gostam de culpar a própria sorte amorosa, ou levar tudo isso para a vida sentimental. Ser solteiro para alguns é ser um imã para desavenças e azares de todo o tipo. De fato, a imaginação do que deva ser o amor para essas pessoas as tornam fracas e desiludidas para todo o resto. Pior que essa, só o tipo de pessoa que após tantos relacionamentos fracassados acha que nunca mais vai amar e que a vida será amargar por causa disso ate o fim. O ser humano é realmente paradoxal.


Lembrei que assistindo Sex and City, eu tive a impressão que nesse atual momento da humanidade, o amor seja um sentimento que se perdeu na evolução humana, não era mais para ele existir, ele parece não fazer mais sentido. Num universo onde as pessoas vivem com medo da própria sombra, fecham-se em seus mundos particulares, são egoístas e desejam ascensão, poder e, principalmente, dinheiro, o amor parece ser um argumento atrapalhador perante tudo isso. O que você quer mais, casar ou ter um Honda Civic (e eu te dou a opção de vir com câmbio automático e bancos de couro)?


Talvez o ponto mais paradoxal entre nós seres humanos e o amor seja a questão de nossa necessidade de controlá-lo, tê-lo e usufruí-lo bem. Woody Allen soube representar isso muito bem em sua mais magnífica obra nos últimos dez anos, Vick Cristina Barcelona. O filme é leve, doce e delicioso, mas nem por isso nos traz uma reflexão poderosa e conflitante sobre a irracionalidade e maluquice dos relacionamentos amorosos. Nada nesse filme sobre o amor é banal ou igual a tudo aquilo que tanto estamos acostumas a ver na Globo, tirando Capitu, claro.


Mas meu enfoque no filme não ficou justamente sobre aqueles que mais chamaram a atenção da crítica, Scarlett Johansson, Penélope Cruz e Javier Bardem e seus brilhantes e maravilhosos personagens a somar um triangulo amoroso exuberante e amedrontador, mas minha atenção se dedicou a Vick, personagem vivida por Rebbeca Hall. Vick e Cristina vão a Barcelona, mas a viagem só começa de verdade quando elas aceitam um hilário pedido de um pintor para passar um final de semana juntos. Vick leva a vida como tantas pessoas modernas desejam levar, esta se especializando em sua área de estudo, planeja trabalhar, se mudar para Nova York e casar com um homem belo, rico e que ela considera ser um padrão de postura e classe. Para Vick, seu sentimento pode ser controlado a medida disso.


Mas Vick não é uma pessoa que conhece a capacidade de nosso coração em nos enganar. E mesmo achando que toda sua vida está resolvida e que seu sentimento é imutável e controlável, ela se apaixona pelo pintor. E como diria Maysa, mas na cabeça de Vick, “meu mundo caiu”. Vick casa e mesmo passando boa parte do filme sem ver mais o pintor (é Cristina quem se envolve com ele e sua lunática ex-mulher), ela está lá, pelas ruas de Barcelona, de braços dados com um homem e atormentada pelo amor irracional que tem por outro.

É, se relacionamentos já são complicados, relacionamentos modernos são mais difíceis ainda. Antes era tudo tão simples, só matar um dragão e pronto, a gata era tua pro resto da vida, hoje, elas nunca ficam felizes nem se você coloca status “namorando” no Orkut.


“Muitas pessoas desejam mais da vida e não sabem exatamente o que é. Elas sabem que tem que haver algo mais na vida, algo mais interessante, mais romântico, mais apaixonante, mais realizador.” – Woody Allen


Com relação a relacionamentos modernos, Mike Nichols nos traz

Closer – Perto Demais. Um filme mordaz e honesto sobre o que acontece quando liberamos nossa capacidade de amar (e nos colocamos a prova de suas conseqüências) e quando lutamos contra esse sentimento (e nos colocamos a prova de suas conseqüências²). Não vou falar de Closer, mesmo porque o filme já é velho e até passou na Globo, você só não assistiu se não quis, mas existe um momento que retrata exatamente a que esse filme veio: Dan (Jude Law) esta saindo de casa porque deu um fora em Alice (Natalie Portman, divina) para correr atrás de Anna (Julia Roberts), a quem ele

acredita que ama. Numa cena muito forte, Alice se joga aos prantos em Dan e eles tem um diálogo memorável.

Alice: Ninguém nunca vai te amar o tanto que eu te amo, por que o amor não basta?
Dan: Eu amo ela, Alice.
Alice: Ah, como se você não tivesse escolha? Há um momento, sempre tem um momento: "eu posso fazer isso, posso entrar nisso ou posso resistir a isso", e eu não sei quando esse momento foi, mas eu aposto que teve um.


Vem também de Closer uma frase inesquecível: “Você não sabe o que é amor, porque não entende o que é compromisso”. Faz sentido pra você?


E pra finalizar esse texto que inicia a temporada 2009 desse blog, eu sou obrigado a voltar a Woody Allen. Na cena final de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, temos uma piada antiga, Um homem diz a um psiquiatra: "Doutor, meu irmão é maluco, ele pensa que é uma galinha". O médico diz: "Então, porque você não o interna?". Ao que Allen responde: "Bem, eu o internaria, mas acontece que preciso dos ovos". Após essa piada ridícula, temos uma brilhante reflexão do próprio Allen, "Assim é como me sinto sobre relacionamentos, eles são completamente irracionais, malucos, absurdos, mas continuamos, insistimos porque a maioria de nós precisa dos ovos".


Enfim, e qual seria o objetivo dessa reflexão toda sobre o sentimento mais controverso do mundo?

Nenhum!

Só confundir a sua cabeça e deixar um pouco mais arejada a minha.